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Morning

      Hoje o dia amanheçeu cinzento, como se eu tivesse acordado em uma capital, percebi enquanto ia pra escola, horizonte cinzento, sol flamejante, e lá em cima, céu azul, cinza nunca combinou com essa cidade pequena, talvez com seu nome, Sombrio, é talvez.
     Enquanto meu pai seguia o mesmo trajeto de sempre, passando pelos mesmos lugares na mesma velocidade, mesmo destino, reparava no sol, na neblina que cobria a avenida, avenida que nunca lembro o nome, nas nuvens cinza, no azul-cinza, essa cor existe ? Sei lá, eu nunca sei. Era exatamente 7:06, e eu estava prestes a ficar cega, ou era meu óculos que estava muito sujo, ou minha mente, que nunca esteve satisfeita, sempre cheia de dúvidas, sempre suja. Será que limpa-la a essa altura do campeonato é possível ? O dia está tão bonito, apezar do cinza, o sol brilha, estou maquiada, meu sorriso não é mais o triste, todos dizem "você está muito melhor agora", "adorei o cabelo", "que linda sua roupa", "que fofinha de delineador", e será que deveria acreditar nisso ? Será que estar apaixonada faz tão bem assim ? O céu está cinza lá fora, o sol brilha, eu não, estou sempre apagada, sempre camuflada, sempre atrás da máscara, das dúvidas, da idade, da maquiagem, dos amigos, dos livros, da concentração, das unhas pintadas, da ironia, do sapato de couro legítimo, por trás de todos esses esconderijos, está a Rafaéla, apagada, na tristeza, na felicidade, na observação, está sempre lá, com seu tênis sujo, sua calça larga, sua camiseta grande, com seus olhos brilhando, e sua gargalhada escrota, diabólica, que poucos conheçem, seu pequeno sorriso bobo, apaixonado, mas, sempre camuflada, nunca fora chamativa, nem convém, mesmo estando lá, com seu ódio, infinito, com seus amigos, poucos, verdadeiros, ogros, divertidos, com seu amor por eles, do fundo do dedo do pé, com toda certeza, sempre estarão na lembrança dela, mesmo que nem lembre de seus nomes as vezes, afinal, tantas pessoas passam pela gente, levam um pedaço, trazem outro, as vezes não, e quando não trazem, é porque deve ter colocado fora, em algum canto, como foi planejado.
           O céu está cinza hoje, o sol brilha, as crianças da escola vizinha gritam como nunca, está quente aqui dentro, o silêncio corrói, o ambiente me causa sono, então 
paro, e afogo em lembranças, em letras, em sorrisos camuflados, em beijos, romances passados, pessoas importantes que passaram, e eu aqui, escrevendo coisas sem sentido na aula de geografia.
           O céu agora está ligeiramente azul, com pequenas nuvens cinzas, neblina, e o sol brilhando, através da cortina o frio está entrando, mas meu casaco continua guardado, e céu está completamente azul, essa definição existe ? O sol continua brilhando, e esquentando a manhã de Abril. O céu está azul hoje, e eu abro um sorriso distante, sorriso de quem lembra de um primeiro beijo, e não fica nem feliz, nem triste, só lembra, só volta, e é como se estivesse vendo tudo se passar de fora do corpo, e nem imaginar a reviravolta que isso causa na mente, mas não é disso que lembro agora, lembro de como a minha vida andava vaga e eu não sabia o porquê não entendo como uma pessoa pode se ocupar tão rápido de você, e você necessitar dela tanto, é como ter vários amantes, amigos, te chamando, mas você prefere passar a tarde inteira com aquela pessoa, olhar as paredes e o teto, qual sorriso quer ver em quais braços quer dormir como uma criança ? Aquela pessoa, sempre.
               Da janela eu vejo as casas, vejo morros, pessoas de um lado para o outro, vejo as nuvens, as árvores, o sol, vejo seus olhos, lembro do teu sorriso, fecho os olhos, sorrio daquele jeito bobo, olho pra o horizonte mais um vez, encosto a cabeça no vidro, fim da manhã.

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